A unidade sincrónica e a identidade diacrónica da consciência impõem-se como questões fundamentais no centro das ciências cognitivas, da filosofia do espírito, da ética e da epistemologia lato sensu. Saber se tal unidade e tal
identidade são qualidades absolutamente reais, apenas funções fortemente plausíveis ou epifenómenos meramente ilusórios, permanece profundamente controverso e tem consequências imediatas no modo como se compreende a cognição e a personalidade. A possibilidade de um sistema objectivo de conhecimento, assim como de um sistema responsável de acções, depende de um certo tipo de auto-consciência unificada. Ora, este campo representacional unificado ou este fluxo de operações subjectivas requer uma actividade, um processo, através do qual o Eu é produzido. Por conseguinte, uma mente radicalmente múltipla ou dissociada é uma mente sem Eu, e esta carência de Eu desestrutura (ou mesmo aniquila) não só processos cognitivos, mas também emocionais e sociais. Porém, a unidade mental é possivelmente apenas o incessante trabalho de auto-unificação e de auto-integração, cujo estatuto subjectivo se afigura assaz ambíguo, pois pode ser descrito quer como um simples objecto de crença, um sentimento intelectual ou um dinamismo inconsciente. Mediante a releitura da noção de apercepção transcendental em Kant e Fichte, tal como da concepção de experiência interna e de auto-consciência em Wittgenstein e W. James, pretende-se interrogar o significado de se ser um Eu e a sua pertinência para o vasto debate contemporâneo. |
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